segunda-feira, 30 de novembro de 2020

 ALEKSANDAR RISTOVIC  (Casar, Jugoslávia - Sérvia - 1933-1994)


As versões que se seguem, foram realizadas a partir de traduções em inglês, da responsabilidade do poeta americano Charles Simic; por tal motivo o texto original dos poemas é omitido.


    SEM TÍTULO

O tempo dos bobos está a chegar,
tempo de tenda de feira
e desse com uma cara de palhaço,
      a maldizer Deus.

Tempo de penas de pavão,
a pena que desliza da direita para a esquerda
sobre o papel de pernas para o ar.

Tempo em que não levantarás o dedo mindinho
sem mergulhar em algo
considerado indecente.

O tempo dos bobos está a chegar,
tempo do professor ignorante
e do livro impossível de abrir
por qualquer lombada. 

domingo, 29 de novembro de 2020

 FERNANDO ORTIZ


             INTERIOR

                                  (Joaquín Sáenz)

Quien sabe si aquella luz viene de fuera o de adentro
de los alzados visillios. Ni a qu´lado del espejo
surge esa mano de niebla que va dibujando un sueño
de relojes y almanaques, de puertas y verdinegros
salones acristalados que son del agua el reflejo.
Agua de un rio muy hondo que viene desde muy lejos
- Aquí las cosas nos miran con grandes ojos secretos -.

Con parsimonia el reloj suena en el patio en silencio.


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          INTERIOR

                               (Joaquín Sáez)

Quem sabe se aquela luz vem de fora ou de dentro
das cortinas subidas. Nem de que lado do espelho
surge essa mão de névoa que vai desenhando um sonho
de relógios, de almanaques, de portas e verde-negros
salões envidraçados que são da água o reflexo.
Água de um rio muito fundo que vem desde muito longe.
- Aqui as coisas observam-nos com grandes olhos secretos -.

Com parcimónia o relógio soa no pátio em silêncio.


                                   

sábado, 28 de novembro de 2020

 D. J. ENRIGHT


BLUE UMBRELLAS

"The thing that makes a blue umbrella with its tail -
How do you call it?" you ask. Poorly and pale
Comes my answer. For all I can tell it is peacock.

Now that you go to school, you will learn how we call
                 all sort or things;
How we mar great works by our mean recital.
You will learn, for instance, that Head Monster
                is not the gentleman's accepted title;
The blue-tailed eccentrics will be merely peacocks;
               the dead bird will no longer doze
Off till tomorrow's lark, for the letter has killed him.
The dictionary is opening, the gay umbrellas close.

              Oh our mistaken teachers -
It was not a proper respect for words that we need,
But a decent regard for things, those older creatures
             and more real.
Later you may even resort to writing verse
To prove the dishonesty of names and their black greed -
To confess your ignorance, to expiate your crime,
            seeking a spell to lift a curse.
Or you may, more commodiously, spy on your children,
            busy discoverers,
Without the dubious benefit of rhyme.


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SOMBRINHAS AZUIS

"Aquilo com que se faz uma sombrinha azul com a sua cauda -
Como se chama?" perguntas. Pobre e pálida
é a minha resposta. Pois tudo o que lhe posso chamar é pavão.

Agora que vais para a escola, aprenderás que nome damos
           a todo o tipo de coisas.
Como arruinamos grandes obras com a nossa récita mesquinha.
Aprenderás, por exemplo, que o Monstro Principal
          não é o título recomendado para os senhor;
Os excêntricos de cauda azul serão apenas pavões;
          a ave morta não continuará a dormitar
Até à brincadeira da manhã, pois a letra matou-a.

          Oh, os nossos professores equivocados! -
Não era um respeito devido pelas palavras que necessitávamos,
Mas um cuidado decente das coisas, essas criaturas mais antigas
          são mais reais.
Mais tarde até poderás recorrer a escrever versos
Para provar a desonestidade dos nomes e a sua ganância negra -
Para confessar a tua ignorância e espiar o teu crime,
         procurando um feitiço para levantar uma maldição.
Ou poderás, mais comodamente, espiar os teus filhos,
         descobridores atarefados,
Sem o benefício duvidosos da rima.

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

 MIROSLAV HOLUB


     NAPOLEÃO

Meninos, quando
nasceu Napoleão Bonaparte,
pergunta o professor.

Há mil amos, dizem as crianças.
Há cem anos, dizem as crianças.
No ano passado, dizem as crianças.
Ninguém sabe.

Meninos, o que 
fez Napoleão Bonaparte,
pergunta o professor.

Ganhou uma guerra, dizem as crianças.
Perdeu uma guerra, dizem as crianças.
Ninguém sabe.

O nosso talhante tinha um cão
chamado Napoleão,
diz Frantisek.
O talhante costumava bater-lhe e o cão morreu
de fome
há um ano.

E todas as crianças têm agora pena
de Napoleão.

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

 AURORA LUQUE


              PENTESILEA

Las crines empapadas como algas
blanquecinas se alejan: el hermoso caballo,
desnuda ya la muerte por los campos,
huye despavorido entre despojos.
En el alba, la cueva delicada
de un pecho frente a un turbio destino de guerrero.

- Qué dulcemente amargo el sabor insensible
de la noche contigo, oh Amazona.
La fruta de tu aliento, tibia y dulce,
no puede ya morder: un dios cambió los dados, y la muerte
anticipó su turno en la escalera
de la vida perfecta de los héroes.
El prólogo, los himnos, los presagios,
la gloria de la red, la humedad de los ojos,
la carnación, el iris, el fulgor, el asombro
con que la diosa engaña sin piedad a los seres
me fueran evitados; solo al darte la muerte
me devolvió tu cuerpo su perfume de sombra
y solo he alcanzado, del amor, la belleza
altiva de su cumbre en brazos de la nada.


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              PENTESILEIA

 As crinas empapadas como algas
esbranquiçadas afastam-se: o formoso cavalo,
desnuda já a morte pelos campos,
foge espavorido entre despojos.
Na alba, a curva delicada
de um peito frente a um turvo destino de guerreiro.

- Que docemente amargo o sabor insensível
da noite contigo, oh Amazona.
A fruta do teu hálito, tépida e doce,
já não pode morder: um deus trocou os dados e a morte
antecipou o o seu turno na escada
da vida perfeita dos heróis,
o prólogo, os hinos, os presságios,
a glória da rede, a humidade dos olhos,
o coração, a íris, o fulgor, o assombro
com que a deusa engana sem piedade os seres
foram-me poupados; só ao dar-te a morte
o teu corpo me devolveu o seu perfume de sombra
e só alcancei, do amor, a beleza
altiva do seu cume nos braços do nada.



terça-feira, 24 de novembro de 2020

 PABLO GARCÍA CASADO


DESAHUCIO

dime! es que hay otra? otracapaz de lavarte
de plancharte de hacerte la comida de acompañarte
al baño después de pasarte el día bebendo?

sabe esa puta lo que es sentirse como el trapo 
donde limpias la polla después de la faena?
no no quiero hablar fuera de aquí a la puta calle

echarlo todo a perder por unas tetas operadas!


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DESPEJO

diz-me! é que há outra? capaz de lavar
de passar a ferro de fazer-te a comida de acompanhar-te
ao quarto de banho depois de passares o dia a beber?

sabe essa puta o que é sentir-se como o trapo
onde limpas o caralho depois da faena?
não não quero falar fora daqui para a puta da rua

deitar tudo a perder por umas tetas operadas!

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

 JULIO MARTÍNEZ MESANZA


    LA TORRE EN EL YERMO

Sólo el orden anhelo, y la belleza
que en la mujer no cabe. Sólo anhelo 
la vida que non duda, la que cumple
sin sombras los designios y no intriga.
Quiero la claridad de las espadas,
la claridad de formas poderosas.
La torre me deslumbra desde el yermo
y hacia la torre marcho. Aunque me aguarde
la desdentada boca del escarnio
o la falaz palabra del sofista
o el hacha doble que el traidor empuña,
veré desde la torre la ignominia.


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    A TORRE NO ERMO

Só a ordem anseio e a beleza
que na mulher não cabe. Só anseio
a vida que não duvida, a que cumpre
sem sombras os desígnios e não intriga.
Quero a claridade das espadas,
a claridade de formas poderosas.
A torre deslumbra-me desde o ermo
e para a torre caminho. Ainda que me aguarde
a desdentada boca do escárnio
ou a falaz palavra do sofista
ou o machado duplo que o traidor empunha,
verei desde a torre a ignomínia.



domingo, 22 de novembro de 2020

 ANTHONY HECHT


A LOT OF NIGHT MUSIC

       Even a Pyrrhonist
Who knows only that he can nrver know
       (But adores a paradox)
Would admit it's getting dark. Pale as a wrist-
       Watch numeral glow,
Fireflies build a sky among the flox,

       Imparting their faint light
Conservatively only to themselves,
       Earthmurk and fluorescent
Sweeten the home of ants. Comes on the night
       When the mind rockets and delves
In blind hyperbolas of its own bent.

       Above, the moon at large,
Muse-goddess, slightly polluted by the runs
       Of American astronauts,
(Poor, poxed Diana, laid open to the charge
       Of social Actaeons)
Miçdly solicits our prtty cash and thoughts.

       At once with their votive mites,
Out of the woods and woodwork poets come,
       Hauling their truths and booty,
Each one a Phosphor, writing by his on lights,
       And with a diesel hum
Of mosquitoes or priests, proffer their worthy
                         duty.

       They speak in tongues, no doubt,
High glossolalia, runic gibberish.
       Some are like desert saints,
Wheat-germ ascetics, draped in pelt and clout.
       Some come in schools, like fish,
Then make their litany of dark complaints;

       Those laugh and rejoice
At liberation from the bonds of gender,
       Race, morals and mind,
As well as meter, rhyme and the human voice,
       Still others arrive to render
The croos-word world in perfectly declined
       
      Pronouns, starting with ME.
Yet there are honest voices to be heard:
      The crickets keep their vigil
Among the grass; in some invisible tree
      Anonymously a bird 
Whistles a a fioritura, a light, vestigial

      Reminder of a time,
An Aesopic Age when all the beasts were moral
      And taught their ways to men;
Some herbal dream, some chlorophyll sublime
      In which Apollo's laurel
Blooms in a world made innocent again.


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MUITA MÚSICA NOCTURNA

       Mesmo um Pirrónico
Que sabe apenas que nunca pode saber
       (Mas adora um paradoxo)
Admitiria que escurece. Mortiços como o brilho
       Dos números de um relógio de pulso,
Pirilampos criam um céu entre floxes,
       
       Transmitindo a luz ténue,
Conservando-a apenas para eles.
       Terra sombria e odor floral
Perfumam a casa das formigas. Chega na noite,
       Quando a mente dispara e exuma
Em hipérboles cegas da sua propensão.

       Por cima, a lua à solta,
Deusa das musas, levemente poluída por corridas
       De astronautas americanos
(Pobre, pustulenta Diana, vítima da acusação
       De Acteons sociais)
Humildemente solicita os nossos trocos e pensamentos.

       Logo, com seus ácaros votivos,
Desde bosques e carpintaria chegam poetas,
       Arrastando as suas verdades e saque,
Todos fosfóricos, escrevendo pelas próprias luzes
       E um zumbido de gasóleo
De mosquitos ou padres, recitam o seu dever
                        palavroso.

      Uma algaraviada, é certo;
Elevada glossolália, geringonça rúnica.
      Alguns como santos do deserto,
Ascéticos de germe de trigo, ornados de petulância e trapos.
      Alguns em cardume, como peixe,
Estes produzem a sua litania de sombrias queixas;

      Esses riem e e alegram-se
Pela libertação das cadeias de género.
      Raça, moral e espírito,
Bem como de metro, rima e voz humana.
      Ainda outros esforçam-se por transmitir
O mundo de palavras cruzadas em pronomes perfeitamente
      
      Declinados, começando por EU.
 Todavia, ouvem-se vozes honestas:
      Os grilos mantêm a vigília,
No meio da erva; nalguma árvore invisível
      Um pássaro anónimo
Assobia uma fioritura, uma suave lembrança

      Vestigial de um tempo,
Uma Idade Esópica, quando todas as bestas eram virtuosas
      E ensinavam tais modos aos homens;
Algum sonho herbáceo, algum sublime clorofilico
      Em que o louro de Apolo
Floresce num mundo de novo inocente.
      

sábado, 21 de novembro de 2020

 LUIS ALBERTO DE CUENCA


          LA HUIDA AL EGIPTO

Le pagaba para que me matase,
y se ha largado al Sur. Todas se marchan.
Aceptan cheques, flores y mentiras.
Se comprometen a matarme. Dicen:
"no verás el otoño. Te lo juro."
Y se van antes de la primavera.
También esta se ha ido. Con un mapa
de Egipto y con las llaves de mi coche.
Qiuera Dios que los vientos no conduzcan
su nave a puerto. Que una lluvia roja
le queme el corazón, si es que lo tiene.
Que nunca llegue a Egipto esa maldita.


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     A FUGA PARA O EGIPTO

Pagava-lhe para que me matasse
e desandou para o Sul. Todas partem.
Aceitam cheques, flores e mentiras.
Comprometem-se a matar-me. Dizem:
"Não verás o outono. Juro-te."
E vão-se antes da primavera.
Também esta se foi. Com um mapa
do Egipto e com as chaves do meu carro.
Deus queira que os ventos não conduzam
a sua nave a porto. Que uma chuva vermelha 
lhe queime o coração, se é que o tem.
Que nunca chegue ao Egipto, essa maldita. 

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

 JON JUARISTI


          SAN SILVESTRE, 1985

Otra vez me han plantado. Ya me veo
enfangado en el güisqui solitario.
A mi edad, sin embargo, es necesario
vigilarse el riñon. Me acuesto y leo.

Las nocheviejas me deprimen. Creo   
que las voy a borrar del calendario.
Para el muermo no habrá otro aniversario
ni ganará a mi costa el jubileo

Vuelvo, hasta que me pesa la cabeza,
a una lectura amena y provechosa:
La Regenta (edición de Juan Oleza)-

Y me duermo seguro de una cosa:
tampoco ganaré, el año que empieza,
el concurso de tangos de Tolosa.


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   SÃO SILVESTRE, 1985

Fiquei plantado outra vez. Já me vejo
enlameado no uísque solitário.
Na minha idade, contudo, é necessário
ter cuidado com o rim. Deito-me e leio.

As noites de fim de ano deprimem-me. Creio
que as vou a eliminar do calendário.
Para o tédio não haverá outro aniversário,
nem ganhará à minha custa o jubileu.

Regresso. até que me pese a cabeça,
a uma leitura amena e proveitosa:
La Regenta (edição de Juan Oleza).

E adormeço seguro de uma coisa:
tampouco ganharei, no ano que começa,
o concurso de tangos de Tolosa.








quinta-feira, 19 de novembro de 2020

WELDON KEES


THE VIEW OF THE CASTLE

The castle is mortgaged now, my dear,
The mortgage is overdue:
The moat, the tower, the beautiful yards,
The silverware and the frightening guards<;
Although it's still on the postal cards,
The castle is mortgaged now, my dear;
They whisper its days are few.

The castel's been cracking for years, my dear,
And has not been properly cleaned;
The rooms are draughty and bring on colds,
The pantries are covered with unpleasent moulds,
It's thought rather queer the foundations holds
After so many years, my dear;
And it's best no to speak of the beams.

The princesse were whores, my dear,
The princesses were whores;
The queen looks on with unconcern,
The king tries hard to seem strong and stern,
Yet neither of them was much startled to learn
That the princesses were whores, my dear.
And the prince was covered with sores.

This is the castle then, my dear,
With its justly famous view.
There are other historic sights in store -
Battlegrounds, parks we might explore,
The hundreds of monuments to war;
Now that you've seen the castle, my dear,
We'll see them before we're through.


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A VISTA DO CASTELO

O castelo está agora hipotecado, minha cara,
A hipoteca está vencida.
A fossa, a torre, as belas cercas,
A baixela de prata, os guardas assustadores;
Embora ainda presente nas cartas postais,
O castelo está agora hipotecado, minha cara;
Murmura-se que tem os dias contados.

O castelo há anos que está cheio de fissuras, minha cara,
E não tem sido adequadamente limpo;
As salas têm correntes de ar e causam constipações,
As despensas cobertas de bolores desagradáveis,
Parece até estranho que os alicerces aguentem
Depois de tantos anos, minha cara;
E será melhor não falar das traves-mestras.

As princesas eram putas, minha cara,
As princesas eram putas;
A rainha repara com despreocupação,
O rei esforça-se por parecer forte e decidido,
Contudo nenhum deles ficou muito espantado ao perceber
Que as princesas eram putas, minha cara,
E o príncipe estava coberto de chagas.

É este, então, o castelo, minha cara,
Com a sua justamente famosa vista.
Há outros panoramas históricos disponíveis -
Campos de batalha, parques que se podem explorar,
As centenas de monumentos à guerra;
Agora que viste o castelo, minha cara,
Iremos vê-los antes de terminar.

 
 

terça-feira, 17 de novembro de 2020

 VICTOR BOTAS


CONTRA LA MADRE DE ALDA
(Antonio Beccadelli)

Ojalá, puñetera,
igual que tu me cierras la ventana
da Alda, se te cierre 
la chocha, mala madre.
                                      Eso seria
para ti más castigo (aumque aparentas
ser una beatona meapilas)
que si te cerrasen de repiente
las puertas evangélicas del Cielo.


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CONTRA A MÃE DE ALDA
(Antonio Beccadelli)

Oxalá, punheteira,
tal como tu me fechas a janela 
de Alda, se te feche
a pachacha, má mãe.
                                  Isso seria
para ti maior castigo ( ainda que aparentes
ser uma beatona de água-benta)
que se te fechassem, de repente,
as portas evangélicas do Céu. 

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

 J. V. CUNNINGHAM


 THE PREDESTINED SPACE

Simplicity asuages
With grace the damaged heart,
Si would I in these pages
If will were art.

But the best engineer
Or metre, rhyme, and thought
Can only tooleach gear
To whwt he sought

If chance with craft combines
In the predestined space
To lend his damaged lines
Redeeming grace.


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  O ESPAÇO PREDESTINADO

A simplicidade alivia
Com encanto o coração danificado.
Assim faria nestas páginas
Se a vontade fosse arte.

Mas o melhor engenheiro
De metro, rima e pensamento
Só pode manejar uma engrenagem
Para o que pretende

Se acaso com engenho combina
No espaço predestinado
Para emprestar a linhas danificadas
Encanto que redima.

domingo, 15 de novembro de 2020

 DICK DAVIS


DESIRE

Of the violence of that pain
What poor traces still remain -

This I learnt: the wry technique
Of avoiding what I seek.


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DESEJO

Da violência de tal dor
Que pobres traços ainda persistem:

Assim aprendi a técnica oblíqua
De evitar o que persigo.

sábado, 14 de novembro de 2020

 MIGUEL D'ORS


             SAPO

En la oscuridad, de pronto,
entre el fango, en un rjncón,
una especie de tubérculo
palpitante y panzurrón.

En su presencia asquerosa,
una inquietante lección:
un sapo es lo que más se 
asemeja a un corazón.

                       Monte de Tomba, 22-III-2012


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       SAPO

Na escuridão, de súbito,
entre a lama, num esconso,
uma espécie de tubérculo
palpitante e pançudo.

Na sua presença asquerosa
uma inquietante lição:
o sapo é o que mais se
assemelha a um coração.

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

 W. H. AUDEN


     DETECTIVE STORY

Who is ever quite without is landscape,
The struggling village street, the house in trees,
All near the church? Or else, the gloomy town-house,
The one with the Corinthian pillars, or
The tiny workmanlike flat, in ahy case
A home, a centre where the thrre or four things
That happen to a man do happen?
Who cannot draw the map of his life, shade in
The country station where he meets hia love
And says good-bye continuaslly, mark the spot
Where the body of his happiness was first discovered?

An unknown tramp? A magnate? An enigma always,
With a well-buried past: and when the truth,
The truth about our happiness comes out.
How much it owed to blackmail and philandering.

What follows is habitual. All goes to plan:
The feud between the local common sense
And intuition, that exasperating amateur
Who's always on the spot by chance before us;
All goes to plan, both lying and confession,
Down to the thrilling final chase, the kill.

Yet, in the last page, a lingering doubt:
The veredict, was it just? The judge's nerves,
That clue, the protestation from th gallows,
And our own smile... why, yes...

But time is always guilty. Someone must pay for
Our loss of happiness, our happiness itself.


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      HISTÓRIA POLICIAL

Quem consegue, por inteiro, renunciar à sua paisagem,
À esconsa rua da aldeia, à casa nas árvores,
Pertinho da igreja? Ou então, à sombria casa citadina,
Essa com colunas coríntias, ou
Ao minúsculo apartamento operário, em qualquer caso
Uma casa, um centro onde as três ou quatro coisas
Que acontecem, nos acontecem?
Quem não consegue traçar o mapa da sua vida, sombrio
Na estação rural onde encontra os seus amores
E se despede continuamente, assinalar o ponto
Onde o primeiro corpo de felicidade foi descoberto?

Um mendigo desconhecido? Um magnata? Um enigma sempre,
Com um passado bem enterrado: e quando a verdade,
A verdade acerca da nossa felicidade é descoberta,
Quanto é devedora de chantagens e galanteios.

A sequência é banal. Tudo corre segundo o plano:
A disputa entre o senso comum local
E a intuição, esse amador exasperante
Que tem sempre a sorte de chegar ao sítio antes de nós;
Tudo corre segundo o plano, a mentira e a confissão,
Até à excitante perseguição final, o assassínio.

Contudo, na última página, uma dúvida perturbante:
O veredicto foi justo? Os nervos do juiz,
Essa pista, esse protesto desde o patíbulo,
E o nosso próprio sorriso... porque, sim...

Mas o tempo é sempre culpado. Alguém deve pagar pela
Nossa perda de felicidade, até pela nossa felicidade.

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

 LUCIANO ERBA


GLI ANNI QUARANTA 

Sembrava tutto possibile 
lasciarsi dietro le curve 
con un supremo golpe di freno 
galoppare in pie sulla sella 
altre superbe cose 
più nobili prospere cose 
apparivano all’altezza degli occhi. 
Ora gli anni volgono veloci 
per cieli senza presagi 
ti svegli di azzurre trapunte 
in una stanza di mobili a specchiera 
studi le coincidenze dei treni 
passi una soglia fiorita di salvia rossa 
leggi “Salve” sullo zerbino 
poi esci in maniche di camicia 
ad agitare l’insalata nel tovagliolo. 
La linea della vita 
deriva tace s’impunta 
scanalca sfila 
tra i pallidi monti degli dei.


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OS ANOS QUARENTA 

Parecia tudo possível 
deixar atrás as curvas 
com um supremo golpe de travão 
galopar de pé sobre a sela 
outras coisas soberbas 
coisas mais nobres prósperas 
apareciam à altura dos olhos. 
Agora os anos passam velozes 
por céus sem presságios 
acordas em colchas azuis 
num quarto de móveis espelhados 
estudas as ligações dos comboios 
passas uma ombreira florida de salva vermelha 
lês “Bem-Vindo” no capacho 
depois sais em mangas de camisa 
para agitar a salada no guardanapo. 
A linha da vida 
desvia cala obstina-se 
salta desfila 
entre os pálidos montes dos deuses. 

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

 RAIMBAUT DE VAQUEIRAS


Altas undas que venez sur la mar
que fai lo vent çai e lay demenar,
de mun amic sabez novas comtar,
qui lay passet? No lo vei retornar!
      Et oy Deu, d'amor!
Ad hora-m dona joi et ad hora dolor!

Oy, aura dulza, qui vens dever lai
un mun amic dorm e seforn'e jai,
del dolz aleyn un beure m'aporta-y!
La bocha obre, per gran desir qu'en ai.
     Et oy Deu, d'amor!
Ad hora-m  dona joi et ad hora dolor!

Mal amar fai vassal d'estran pais,
car en pior tornan e sos jocs e sus ris,
ja non cudey mon amic me trays,
qu'eu lli doney ço que d'amor me quis.
    Et oy Deu, d'amor!
Ad hora-m dona joi et ad hora dolor!


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Altas ondas que vindes sobre o mar,
que o vento faz aqui e ali agitar,
do meu amigo sabeis novas contar, 
que o atravessou? Não o vejo regressar!
   Ai, Deus, o amor
Ora me traz alegria, ora dor!

Ai, doce brisa, que vens de lá,
onde o meu amigo dorme e está,
do doce alento um sopro traz-me já,
a boca abro pelo grande desejo que vem de lá!
   Ai, Deus, o amor
Ora me traz alegria, ora dor!

É mau amar vassalo de outro país,
que jogo e riso se torna em choro.
Não posso crer, amigo, que me traís
pois de amor lhe dei tudo o que quis. 
   Ai, deus, o amor
Ora me traz alegria, ora dor!

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

 GIUSEPPE GIOACHINO BELLI


ER PATTO-STUCCO 

Sto prelato a la fijja del zartore, 
che cciannava a stirajje li rocchetti, 
je fece vede drent’a un tiratore 
una siciòtola piena de papetti, 

dicennoje: “Si vvòi che te lo metti, 
sò ttutti tui e tte li do dde core”. 
E llei fece bbochino e du’  ghiggnetti 
eppoi s’arzò er guarnello a mmonzignore. 

Terminato l’affare, er zemprisciano, 
pe ppagajje er neloggio de la sporta, 
pijjò un papetto e je lo messo in mano. 

Dice:” Un solo?! E vvor di sta torta? 
Ereno tutti mii!...” - “Fijjola, piano,” 
disce, “sò tutti tui, uno pe vvorta”. 

                                                              16 Ottobre 1833


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O PREÇO FINAL 

Este prelado à filha do alfaiate, 
que veio engomar-lhe a vestimenta, 
mostrou dentro de uma caixa 
uma bandeja cheia de moedas, dizendo: 

“Se me deixares metê-lo, 
são todas tuas e de bom grado”. 
Com uma piscadela e um sorrizinho 
levantou as saias a monsenhor. 

Terminado o assunto, o espertalhão 
para pagar o aluguer da rata, 
pegou numa moeda e pôs-lha na mão. 

Disse: “Apenas uma?! Agora como? 
Eram todas minhas!...” - “Filha, calma”, 
disse: ”São todas tuas, uma por volta”.

                                                               16 de Outubro 1833




LI DU’ GGENER’ UMANI 

Noi, se as, ar monno semo ussciti fori 
impastati de mmerda e dde monnezza. 
Er merito, er decoro e la grannezza 
sò ttutta marcanzia de li siggnori. 

A ssu’ Eccellenza, a ssu’ Maestà, a ssu’ Artezza, 
fumu, patacche, titoli e sprennori 
e a nnoantri artiggiani e sservitori 
er bastone, l’imbasto e la capezza. 

Cristo creò le case e li palazzi 
p’er principe, er marchese e ‘r cavajjere, 
e la terra pe nnoi facce de cazzi. 

E cquanto morze in crosce, ebbe er penziere 
de sparge, bbontà ssua, fra ttanti strazzi, 
pe cquelli er zangue, e ppe nnoantri er ziere. 

                                                                          7 Aprile 1834


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OS DOIS GÉNEROS HUMANOS 

Nós, é sabido, fomos lançados ao mundo 
amassados de merda e de imundície. 
O mérito, o decoro e a grandeza 
é tudo mercadoria dos senhores. 

A sua Excelência, a sua Majestade, a sua Alteza 
vénias, prebendas, títulos e honrarias 
e a nós, artesãos e servidores 
cachaporra, dízimo, cabresto. 

Cristo criou as casas e os palácios 
para príncipe, marquês e cavaleiro 
e a terra, para nós, feita de cacos. 

E ao morrer na cruz, deliberou 
que verteria, bondade sua, entre tormentos, 
por aqueles o sangue e por nós o soro. 

                                                                       7 de Abril 1834

domingo, 8 de novembro de 2020

 AMIR SHAHI (SÉC XV)


Que me importa se todos
me olham de lado
e onde tenho um defeito,
centenas são suspeitos?
Sou apenas um espelho
e todos os que me desprezam
apenas vêem o que há,
reflectido, deles.


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FAGHANI (SÉC XV-XVI)

Traz vinho, rapaz - sei que estou a morrer;
caído de bêbedo é como deixarei o espectáculo terreno:
entrei na vida completamente ignorante
e é precisamente assim que tenciono sair.


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VAHSHI (SÉC XVI)

Suave brisa, informa o meu senhor,
que em panegíricos sou o melhor,
mas se ele for recalcitrante e rude
informa-o que, na sátira, também excelo. 

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

 FERNANDO ORTIZ



                LA PRIMAVERA
                              
                                    (Homenaje a Juan Gil-Albert)

¿Qiuén no anduvo, una vez, en primavera,
ajeno entre los hombres, sólo atento
al canto de los pájaros y al humus
de la tierra de abril tras lluvia leve?

  Una gota de acíbar es entonces
más dulce que la miel. Suaviza
las cuerdas interiores que así pueden
en el pecho vibrar. Y es ese arpegio,
ese trémulo son, cual un misterio
que desde lo hondo clama. Un don supremo.
Una perene primavera triste
y espléndida a la vez. Es un absorto
amor a lo que alienta. Son tus versos.


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             A PRIMAVERA

                              (Homenagem a Juan Gil-Albert)

Quem não andou, uma vez, na primavera,
alheado dos homens, atento apenas
ao canto dos pássaros e ao húmus
da terra de abril depois de chuva leve?

  Uma gota de aloé é então
mais doce que o mel. Suaviza
as cordas interiores que assim podem
vibrar no peito. E é esse arpejo,
esse trémulo som, qual o mistério
que desde o fundo clama. Um dom supremo.
Uma perene primavera triste
e esplêndida ao mesmo tempo. É um absorto 
amor ao qual alenta. São os teus versos.



terça-feira, 3 de novembro de 2020

 D. J. ENRIGHT


TEA CEREMONY

The garden is not a garden, it is an
        expression of Zen;
The trees are not rooted in earth, then;
        they are rooted in Zen.
And this Tea has nothing to do with thirst:
It says the unsayable. And this bowl
        is no vessel: it is the First
And the Last, it is the Whole.

Beyond the bamboo fence are life.size people,
Rooted in precious little, without benefit of philosophy,
Who grow the rice, who deliver the goods, who
Sometimes bear the unbearable. They too
       drink tea, without much ceremony.

So pour the small beer, Samichan. And girls
      permit yourselves a hiccup, the thunder
Of humanity. The helpless alley is held by
      sleeping beggars under
Their stirring beards, and the raw fish curls
At the end of the day, and the hot streets cry
     for the carelees scavengers.

We too have our precedents. Like those who
    invented this ceremony.
We drink to keep awake. What matter
If we find ourselves beyond the pale, 
   the pale bamboo?


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CERIMÓNIA DO CHÁ

O jardim não é um jardim, é uma
    expressão de Zen.
As árvores não têm raízes na terra, logo
    têm raízes no Zen.
E este Chá nada tem a ver com sede:
Diz o indizível. E esta malga
    não é um vaso; é o Primeiro
E o Último, é o Todo.

Para lá da sebe de bambu há gente do tamanho da vida,
Com raízes em escassez preciosa, sem benefício de filosofia,
Que cultiva o arroz, que entrega a mercadoria, que
Por vezes suportam o insuportável. Também
    bebem chá, sem muita cerimónia.

Portanto, verte a cerveja leve, Sumichan. E raparigas,
    autorizem-se um soluço, o trovão
Da humanidade. O beco desesperado é mantido por
    mendigos adormecidos debaixo
Das suas barbas emaranhadas, e as roscas de peixe cru
Ao fim do dia, e as ruas quentes reclamam
    por necrófagos descuidados.

 Também temos os nossos antecedentes. Como os que
    inventaram esta cerimónia.
Bebemos para ficar acordados. Que importa
se nos encontramos além da paliçada,
    o pálido bambu?

segunda-feira, 2 de novembro de 2020

 MIROSLAV HOLUB


PORTO

Mas o mar foi medido
e acorrentado à terra.
E a terra foi medida 
e acorrentada ao mar.

Lançaram
gruas, anjos magros,
calcularam
o pranto de sereias viúvas,
previram
a inquietação nervosa de boias,
esboçaram
o labirinto de rotas à volta do mundo.

Construíram 
os Minotauros de barcos.

Descobriram cinco continentes.

A terra foi medida
e acorrentada ao mar.
E o mar foi medido
e acorrentado à terra.

Tudo o que resta
é uma casa pequena sobre o canal.
Um homem que falava suavemente,
uma mulher com lágrimas nos olhos.
Tudo o que resta é a lâmpada nocturna,
o continente da mesa,
a toalha, uma gaivota que não voa a fugir.

Tudo o que resta
é uma chávena de chá,
o oceano mais fundo do mundo.


domingo, 1 de novembro de 2020

 AURORA LUQUE


             DEL ORÁCULO FALSO

     Había oído hablar ge las sorprendentes irisaciones de la aurora
sobre el mar Jónico cuando se contempla de la cima del Etna.
                                                         MARGUERITE YOURCENAR

No esperé así la vida:
el asombro, la ráfaga instantánea de la dicha,
la humiliación,
el tedio.

Pero es que aún la lava de Vesubio
nos podría abrasar, o tal vez los milagres              
del mar semidivino.

No esperé así la vida:
paraísos perdiéndose
o batallas perdidas de antemano.


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      DO ORÁCULO FALSO

    Tinha ouvido falar das surpreendentes irisações da aurora
sobre o mar Jónio quando se contempla do cimo do Etna.
                                                    MARGUERITE YOURCENAR

Não esperei assim a vida:
o assombro, a rajada instantânea da sorte,
a humilhação,
o tédio.

Contudo, a lava do Vesúvio ainda
me poderia abrasar, ou talvez os milagres
do cimo do Etna ou a beleza
do mar semi-divino.

Não esperei assim a vida:
paraísos perdendo-se
ou batalhas perdidas de antemão. 

  FRANK O'HARA PISTACHIO TREE AT CHATEAU NOIR Beaucoup de musique classique et moderne Guillaume and not as one may imagine it sounds no...