quinta-feira, 15 de julho de 2021

 JON JUARISTI


AGRADECIDAS SEÑAS

                                  A Luís García Montero

No tengo casa propia
ni coche. Vivo solo
y mi cuenta corriente
está en números rojos.

Habito un ventisquero,
un frío promontorio
batido por las turbias
galernas del otoño.

Pasé la cuarentena,
doblé mi Cabo de Hornos,
perdí todos los mastiles
del alma en los escollos.

He vivido en países
no demasiado exóticos,
pero del triste mundo
sé más que los geógrafos.

Nací bajo Saturno,
nocturno dios del plomo.
El mío ha sido un tiempo
tirando a tormentoso.

Mi juventud distraje
con juegos peligrosos.
Sigo siendo de izquierdas,
aunque se note poco.

No recuerdo las veces
que resbalé hasta el fondo
por el derrumbadero
de los buenos propósitos

ni quiero dar noticia
de lances más gloriosos:
volver atrás la vista
me pone melancólico.

Vaya sólo un consejo
para los paranoicos:
la amnesia, si oportuna,
aleja el mal de ojo.

Tocando a la memoria,
mejor pecar de sobrio:
mi infancia son recuerdos
de algún parque zoológico

y púberes deslices
de vate vanidoso
y megalomanía
en pantalones cortos.

Recelo hoy de los trucos
de los poetas mozos,
y a distinguir me paro
las voces de los bozos.

Amo a mí pueblo vasco,
un pueblo noble y tosco
metido en un atajo
que firmaria el Bosco.

Le dejaré en herencia
mis huesos y mis polvos
y cuatro o cinco libros
de versos rencorosos.

Y si la poesía
me ha dado casi todo
)o sea, el buen puñado
de amigos que atesoro),

reñir y enamorarme
son artes que conozco
mejor que la poesía:
juzgad ahora vosotros.


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AGRADECIDAS MORADAS

                                     Para Luis García Montero


Não tenho casa própria
nem carro. Vivo sozinho
e a minha conta corrente
está em números vermelhos.

Habito uma neveira,
um frio promontório
batido pelas turvas 
ventanias do outono.

Passei a quarentena,
dobrei o meu Cabo de Horn.
perdi todos os mastros
da alma nos escolhos.

Vivi em países
não demasiado exóticos,
mas do triste mundo
sei mais que os geógrafos.

Nasci sob Saturno,
nocturno deus do chumbo.
O meu tem sido o tempo
tirando para o tormentoso.

A minha juventude distraí
com jogos perigosos.
Continuo sendo de esquerdas,
embora se note pouco.

Não recordo as vezes
que resvalei até ao fundo
pelo desfiladeiro
dos bons propósitos,

nem quero dar notícia
de lances mais gloriosos:
olhar para trás 
põe-me melancólico.

Siga só um conselho
para os paranóicos:
a amnésia, se oportuna,
afasta o mau olhado.

No que respeita à memória
é melhor pecar por sábio:
a minha infância é recordação
de algum jardim zoológico

e púberes deslizes
de vate vaidoso
a megalomania
dentro de calções.

Receio hoje os truques
dos poetas jovens
e detenho-me a distinguir
as vozes dos buços.

Amo o meu povo basco,
um povo nobre e tosco
metido num embrulho
que assinaria Bosch.

Deixar-lhe-ei em herança
os meus ossos e o pó
e quatro ou cinco livros
de versos rancorosos.

E se a poesia
me deu quase tudo
(ou seja, o bom punhado 
de amigos que entesouro)

discutir e enamorar-me
são artes que conheço
melhor que a poesia:
julgai agora vós.

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