sábado, 3 de abril de 2021

 MIGUEL D'ORS



"MADE IN PAKISTAN"


Manos pakistaníes
que en un insospechable rincón del tiempo, anónimas
y remotas, pasasteis sobre este mismo pliegue
en que ahora están las mías; que por unos momentos
dejasteis vuestra áspera tibieza
sobre este colorido que ahora mismo,
aquí en mi casa de Granada, España,
acba de salir de su paquete,
como el pollo del huevo,
hacía la lux de un mundo con que muchos
sueñan en Pakistán
y luego vos alejasteis para siempre,
al fondo de una escura cadena de trabajo.
¿A quién pertenecíais, manos menestrosas?
¿qé vida estaba tras vosotras, qué
ilusiones, qué rostros,
qué penas y qué nombres? ¿qué puñado
de monedas ilusas
contasteis un minuto después de haber cerrado
este envoltorio? ¿Erais las manos de 
una mujer de tez vaerdimorena
y cabello tirante
llegadas de la frente sudorosa de un hijo
enfermo entre un oscuro
revoltijo de trapos, o de una
pobre escudilla, o de las ubres secas
de una cabra encerrada entre cartones?
¿O las manos de un niño - al que le estaban grandes
la camisa y los ojos -, que llegaban
ateridas después de atravesar la noche
desde un barrio harapiento, soñando con un día
del futuro, quién sabe, detener
penaltis en alguna
liga de fútbol europeu? Manos
que ahora mismo las mías adivinan y sienten
ligadas a una vida
desconocida pero que misteriosamente
es la mía también, y estrechan, en un gesto
de secreta unidad,
por encima del tiempo y la distancia.

Canción, por donde vayas
proclama que entre todas mis horas hubo una
en que en una camisa comprada en las rebajas
vi que todas las vidas son una misma Vida.  

                                                          6-XII-2016


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"MADE IN PAKISTAN"

Mãos paquistanesas,
que numa inesperada esquina do tempo,, anónimas
e remotas, passastes sobre esta mesma dobra
em que estão as minhas; que por uns momentos,
deixastes a vossa áspera tibieza
neste estampado que agora mesmo,
aqui na minha casa de Granada, Espanha,
acaba de sair do seu embrulho,
como o pinto do ovo,
para a luz de um mundo com que muitos 
sonham no Paquistão
e logo vos afastastes para sempre,
para o fundo de uma obscura cadeia de trabalho.
A quem pertencereis, mãos industriosas?
que vida estava por trás de vós, que
anseios, que rostos,
que penas e que nomes? que punhado
de moedas ilusas
contastes um minuto depois de ter fechado
este invólucro? Ereis as mãos de
uma mulher de um moreno verde,
de cabelo esticado,
vindas da fronte suada de um filho
enfermo entre um escuro
emaranhado de trapos, ou de uma 
pobre malga, ou das tetas secas
de uma cabra fechada entre cartões?
Ou as mãos de um menino- a quem sobravam 
a camisa e os olhos -, que chegavam
enregeladas depois de atravessar a noite
desde um bairro andrajoso, sonhando que um dia,
no futuro, quem sabe, defenderia
penaltis nalguma
liga de futebol europeu? Mãos
que agora mesmo as minhas adivinham e sentem
ligadas a uma vida
desconhecida, uma vida que misteriosamente
é também a minha e estreitam, num gesto
de secreta unidade,
por cima do tempo e da distância.

Canção, por onde passes
proclama que entre todas as minhas horas houve uma,
em que numa camisa comprada nos saldos.
vi que todas as vidas são uma Vida.

                                                              6-XII-2006





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