quinta-feira, 10 de setembro de 2020

 MIROSLAV HOLUB (Pilsen, Checoslováquia 1923-1998)


As versões dos poemas de  Holub foram realizadas a partir de traduções em inglês, pelo que é omitido o poema original.



        CINDERELA

Cinderela está a escolher ervilhas:
podres para aqui, sãs para ali,
sim e não, não e sim.
Sem batota. Sem inverdade.

De algures o som da dança.
Os cavalos de alguém cabriolam.
Alguém cavalga com aprumo.

O chinelo já não está curto,
foram cortados os dedos para o baile.
Esta é a verdade. Não duvidem.

Cinderela está a escolher ervilhas,
podres para aqui, sãs para ali,
sim e não, não e sim.
Sem batota. Sem inverdade.

Chegam coches à porta do palácio
e todos fazem vénia perante 
a noiva auto-proclamada.

Não corre sangue. Apenas se ouvem
nitidamente pássaros vermelhos, de locais
distantes, quando aterram, de penas eriçadas.

Cinderela está a escolher ervilhas,
podres para aqui, sãs para ali,
sim e não, não e sim.

Sem pequenas nozes ou príncipe encantador
e todos ansiamos pelos braços da mãe,
mas há apenas uma esperança:

Cinderela está a escolher ervilhas:
gentilmente como quem une juntas
com dedos suaves como uma pena,
ou como quem amassa o pão.

E embora possa ser leve como o ar,
não mais que canção na cabeça de alguém,
existe aí um filamento de verdade.

Cinderela está a escolher ervilhas:
podres para aqui, sãs para ali,
sim e não, não e sim,
sem batota neste período.

Ela sabe estar por conta própria.
Sem pombos auxiliadores; está sozinha.
E, contudo, as ervilhas serão escolhidas.


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